A sucessão de empresas familiares representa um dos maiores desafios do Direito Empresarial. Trata-se de um momento que exige planejamento estratégico, técnico e emocional, a fim de preservar o legado, os ativos e os valores construídos ao longo de gerações. Nesse cenário, as golden shares, ou ações de classe especial, têm se consolidado como importante ferramenta de governança e sucessão patrimonial.
Embora tradicionalmente associadas a contextos de privatização estatal como forma de assegurar o poder de veto da União em empresas estratégicas, as golden shares vêm sendo adaptadas com sucesso ao ambiente das sociedades anônimas de capital fechado, em especial as de controle familiar.
Natureza Jurídica e Fundamento Legal
O ordenamento jurídico brasileiro não traz uma disciplina específica para as golden shares. No entanto, sua utilização é perfeitamente viável com base na Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76), que permite a criação de diferentes classes de ações com direitos e restrições específicas, desde que previstas expressamente no contrato social.
No contexto sucessório, as golden shares são estruturadas para conferir a determinados acionistas — muitas vezes, o patriarca ou membros estratégicos da família — poderes especiais de decisão, como o direito de veto em deliberações fundamentais: alienação de ativos estratégicos, alteração do objeto social, mudanças na estrutura societária, fusões ou cisões, entre outros.
Instrumento de Proteção e Continuidade
Em momentos de transição geracional, a utilização de ações especiais permite que a empresa mantenha sua estabilidade decisória e garanta que as decisões estratégicas permaneçam alinhadas com os interesses de longo prazo da família controladora.
Ao reservar poderes específicos a uma ou mais golden shares, cria-se uma barreira institucional contra decisões impensadas ou orientadas por interesses imediatistas, que possam comprometer o patrimônio, a cultura empresarial ou os valores fundadores da organização.
Além disso, a golden share pode funcionar como mecanismo de contenção de conflitos, evitando disputas entre herdeiros ao delimitar, previamente, os limites de atuação e os direitos de cada classe de ações.
Governança Familiar e Previsibilidade
Do ponto de vista da governança corporativa, a adoção das golden shares proporciona maior previsibilidade sucessória, reforça a transparência estatutária e reduz riscos de judicialização. Contudo, sua implementação exige cuidados técnicos rigorosos:
Além disso, a combinação das golden shares com conselhos consultivos ou administrativos, programas de formação de herdeiros e outros instrumentos de governança fortalece a cultura institucional e prepara a nova geração para os desafios da liderança.
Aspectos Tributários Relevantes
A valoração diferenciada atribuída às ações especiais pode impactar o cálculo do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação). Assim, é indispensável que o planejamento societário sucessório seja acompanhado por profissionais especializados também na seara tributária, evitando riscos de autuações ou questionamentos futuros.
As golden shares representam um valioso instrumento jurídico de preservação do controle familiar e de continuidade da estratégia empresarial no processo sucessório. Quando bem estruturadas, promovem segurança jurídica, reduzem conflitos e contribuem para a perpetuação do legado familiar.
Sua aplicação, contudo, demanda uma abordagem personalizada, atenta às especificidades da empresa, do grupo familiar e da estrutura societária existente. Com o suporte técnico adequado, é possível transformar a complexidade da sucessão em uma oportunidade de fortalecimento institucional e de consolidação de uma governança sólida e duradoura.
Referências: https://www.migalhas.com.br/depeso/422838/golden-share-controle-e-continuidade-no-planejamento-sucessorio
https://legale.com.br/blog/golden-share-no-direito-empresarial-estrategia-e-impacto-juridico/#google_vignette
Renan Trindade
Advogado OAB/SP 472.152
Advogado e sócio do escritório Marinho Advogados Associados. Graduado em Direito pelo UNIVEM – Centro Universitário Eurípides de Marilia. Pós-Graduado em Advocacia Empresarial pela EBRADI – Escola Brasileira de Direito. Certificado em Data Protection Officer – DPO, pela Pontifícia Universidade Católica – PUC, de Campinas. Membro das Comissões de Direito Digital e Proteção de Dados, da Ordem dos Advogados do Brasil, subseção de Marília. Atua na área do Direito Empresarial, Propriedade Intelectual, Direito Digital e Proteção de Dados em âmbito consultivo, administrativo e judicial.
Contato: renantrindade@marinho.adv.br.
Rua José Joaquim de Oliveira, 249 - Jardim Acapulco
CEP 17.525-170
Tel. 14 3453 1361
Avenida Paulista, 491 - Conj. 51
Bela Vista
CEP 01.311-000
Tel. 11 2096-3165
Avenida Pref. Paulo Novaes, 1067 - Centro
CEP 18.705-000
Tel. 14 3448-1475
SCS, Quadra 1, Ed. Gilberto Salomão, Conj. 1004 - Asa Sul
CEP 70.305-900
Tel. 14 3453-1361